Wednesday 29 November 2017

Make America Christian Again

David Warren
O erro é um grande dissipador de tempo e de energia. Quem o disse foi Goethe, numa carta que escreveu a alguém, mas poderia ter sido outra pessoa qualquer, em qualquer outro lado. Sim, Goethe diz que num mundo em que o erro se repete de forma incessante, a verdade deve ser repetida frequentemente.

Recordei-me desta máxima devido ao meu péssimo hábito de ler as notícias – outra actividade que dissipa tempo e energia. As notícias confundem-nos. Certamente não é preciso dar exemplos.

Há tolos santos, embora actualmente sejam difíceis de encontrar; há tolos triviais; e depois há tolos maliciosos. Estes útimos são grandes dissipadores, não só deles mesmos. Faríamos bem em ignorá-los totalmente, mas o problema é que tendem a ser ambiciosos. É preciso tempo e energia para os travar.

Na América de hoje (enquanto Canadiano incluo-me neste continente), parece que o erro está consagrado na Constituiçao. Está expresso como separação entre Igreja e Estado. Isso significa uma coisa para os seus autores, que eram cristãos, e outra para os seus descendentes pagãos.

Ao excluir da vida pública os próprios princípios sobre os quais se fundou a sociedade americana, o erro fica com uma espécie de monopólio, para ser imposto por um sem número de departamentos de Estado.

Aqui neste “espaço seguro” somos maioritariamente católicos, e os pais fundadores (pré e pós-revolução) eram maioritariamente protestantes, mas as verdades fundamentais a que se referiam atravessavam fronteiras confessionais.

A Virgínia, o Massachusetts e o Québec eram regiões bem distintas, tanto em termos eclesiais como gerais, mas para um observador da China seriam bastante semelhantes. A noção do homem num mundo decaído, nascido escravo do pecado e a precisar de redenção, era comum a todas as facções. Daqui seguiam muitas particularidades.

Entre os poucos filmes que já vi inclui-se “Nashville”, realizado pelo falecido Robert Altman, para o bicentenário dos Estados Unidos. Entre os seus enredos inclui-se a odisseia de uma jornalista pretensiosa da BBC (desempenhada por Geraldine Chaplin), em busca da “verdadeira América”, mas constantemente a enganar-se.

Num certo domingo de manhã ela encontra-se num gigantesco parque de estacionamento, cheio de autocarros escolares amarelos. Encontra nestes monstros metálicos um grande simbolismo.

Mas depois a câmara mostra-nos várias igrejas – baptistas, metodistas, episcopalianas, etc. – em que se encontram os vários protagonistas cómicos do filme. Todos estão a cantar, a rezar e a ouvir homilias. Aí vemos a “verdadeira América” que a menina bem de Inglaterra não tinha conseguido ver.

Refiro o filme apenas porque é tão recente; afinal de contas, 1976 não foi assim há tanto tempo. Eu lembro-me da data e estou na casa dos 60. Lembro-me que quando estava a crescer em Ontário o que era normal era ir à Igreja. Eu não fui criado por cristãos praticantes, mas percebia que isso é que era fora do comum.

De certa forma os meus pais eram liberais à moda antiga, anticlericais por disposição e a minha mãe, na verdade, era conscientemente ateia, mas penso que nunca lhes passou pela cabeça sugerir que a cultura religiosa do continente inteiro tinha de ser destruída. Até dizia que “os crentes são mais bem-comportados”.

Isso porque dão por adquiridas coisas sobre as quais os outros precisam de reflectir – com todos os erros que se seguem naturalmente quando alguém precisa de reinventar a moralidade a partir do zero. Os crentes tinham noções básicas do bem e do mal, implantadas desde pouco depois do nascimento. Até as crianças de lares sem fé absorviam estes valores da sociedade em geral.

Sim, a maioria dos crentes era hipócrita; e também eram ateus, na prática, naqueles momentos em que se esqueciam que Deus nos observa. Esta não é uma particularidade dos cristãos, mas da condição humana: encontramo-nos frequentemente no erro.

E é por isso que Goethe – também ele um liberal à antiga – diz que devemos regressar à verdade, como quem desperta do sono, sentindo-se refrescado. Domingo, “todo o santo Domingo”, era o nosso toque de despertar.

Não sou um daqueles parvos ingénuos que pensa que a América simplesmente pensou duas vezes e concluiu, de forma democrática, que a religião era inconveniente e dispensável. Deu muito trabalho minar a religião, resultado de uma “longa marcha pelas instituições” dos progressistas. Foi preciso muita capitulação das nossas figuras de autoridade.

E como todos sabem – e como todos os progressistas gostam de proclamar – a história não anda para trás. Não há nada na antiga América que se vá reedificar espontaneamente. Não foi sozinha que se edificou, foi resultado do trabalho e da aspiração humana, com raízes muito anteriores à sua própria descoberta e povoação.

Muita coisa foi destruída no espaço de duas gerações. Não estamos perante uma transição geracional, mas civilizacional. Quando abandonamos o Cristianismo, o nosso passado cristão torna-se incompreensível para nós. Os nossos antepassados tornam-se impossivelmente estranhos. A sua prática religiosa torna-se um factor de alienação. Os cristãos sobreviventes tornam-se uma seita exótica minoritária que precisa de ser cuidadosamente regulada e vigiada pelo Governo.

O slogan “Make America Great Again” pode ter resultado durante a última eleição presidencial, mas são palavras vazias. Partem do princípio que houve uma América que em tempos foi grande. Talvez tenha havido, mas esta já não é a América. “Já não estamos no Kansas”

Mesmo o conceito de grandiosidade é vazio se não puder ser especificado. Estamos a falar de grandeza geográfica? Mas isso já somos. Económica? Mas já produzimos bens de gosto duvidoso em quantidades sem precedentes. Ou estaremos a falar de um conceito de virtude e de nobreza?

Claro que é isso, apesar da confusão. Mas sem um conceito claro do que é nobre e virtuoso continuamos desorientados. E estas coisas não virão do nada.

E é por isso que proponho um slogan alternativo, “Make America Christian Again”. E já que a história não anda para trás, concentremo-nos em fazê-la católica, desta vez. Caso contrário estaremos a dissipar tempo e energia. 


David Warren é o ex-director da revista Idler e é cronista no Ottowa Citizen. Tem uma larga experiência no próximo e extreme oriente. O seu blog pessoal chama-se Essays in Idelness.

(Publicado pela primeira vez na sexta-feira, 24 de Novembro de 2017 em The Catholic Thing)

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